Na esteira das mudanças
recentes no financiamento imobiliário, promovidas pela Caixa Econômica Federal,
o acesso ao crédito para aquisição de imóveis tende a ficar mais restrito
em 2025. O banco público aumentou o valor da entrada e diminuiu o total
financiado para compra de unidades via Sistema Brasileiro de Poupança e
Empréstimo (SBPE).
Diante dessa alteração, que também afeta as transações em
bancos privados, o crédito ficará mais seletivo no próximo ano, segundo
especialistas e integrantes do setor.
Essas movimentações, que ocorrem para tentar dar fôlego aos
fundos usados pelo sistema financeiro, também devem impactar a venda e as
avaliações de compradores nos próximos meses.
Na prática, a Caixa endureceu as regras para tentar manter
os valores de concessão de crédito habitacional dentro do orçamento aprovado
para 2024 (veja as novas regras abaixo). Esse problema de financiamento,
com demanda acima do fundo existente, também afeta bancos do varejo. Ou
seja, o apetite por esses recursos está acima do montante disponível. No caso
do SBPE, o cenário é ainda mais complexo com a fuga de valores da
poupança diante
de Selic em alta.
Para ter uma ideia, os valores dos financiamentos via SBPE
saltaram de R$ 7,7 bilhões, em 2023, para R$ 8,3 bilhões em 2024, levando em
conta o recorte do ano até novembro (veja no gráfico). No país, o aumento
foi ainda maior, passando de R$ 137,4 bilhões para R$ 169 bilhões, segundo
dados da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança
(Abecip).
O presidente da Abecip, Sandro Gamba, afirma que existem
dois movimentos que restringem o acesso ao crédito a partir desse problema de
fundo. O primeiro ocorre via o aumento no valor da entrada e diminuição do
montante financiado, promovido pela Caixa. Na outra ponta, instituições
financeiras privadas estão optando por não alterar os critérios de
elegibilidade, mas compensando isso com o aumento de juro dos
financiamentos, segundo Gamba:
— Uns estão optando por mudar, alterar as regras e outros
estão tomando a decisão de aumentar a taxa de juros. Aí são as decisões de cada
agente financeiro. Mas, no final, você está restringindo e reduzindo a
distribuição do crédito imobiliário, fazendo com que a conversão de quem vai
adquirir o financiamento se torne mais difícil.
Marco Aurélio Stumpf Gonzalez, professor dos cursos de
Engenharia Civil e Arquitetura e Urbanismo na Unisinos, pesquisador e
especialista em mercado imobiliário, não crê em grandes alterações no
mercado de compra e venda de imóveis. No entanto, afirma que essas
mudanças na concessão de crédito imobiliário força alguns cidadãos a optarem
por financiamentos mais caros e mais longos. Isso ocorre porque nem todos têm
condições de dar uma entrada maior, conforme novo modelo da Caixa, por mais que
o juro seja mais baixo:
— Se a pessoa não consegue se enquadrar naquela situação,
não tem a entrada necessária, vai ter a opção de pagar um juro maior, que é uma
questão de longo prazo. Tu resolve no curto prazo, se não tem dinheiro, mas
paga mais caro.
O professor destaca que esse ambiente, com parcela da
população fora do grupo com potencial de compra de imóvel, também pode
gerar impacto de maior demanda no lado do aluguel.
Impacto nas vendas
Com crédito mais restrito, uma parcela de potenciais
compradores de imóveis saiu do mercado. Portanto, o volume de pessoas em busca
de financiamento tende a diminuir. Nesse sentido, com oferta grande de unidades
à venda, a relação entre compra e venda pode sofrer alterações, segundo
especialistas:
— Eu acho mais provável que o vendedor se ajuste ao mercado.
Se eu não consigo negociar por esse preço, porque a pessoa não tem a entrada
suficiente, eu tenho que baixar o valor — observa Gonzalez.
O presidente da Abecip afirma que o poder de barganha de
quem tem crédito e se encaixa nas novas condições de financiamento aumenta
nesse ambiente mais restritivo:
— Na maior parte do mercado, o volume comercializado de
imóveis está atrelado ao financiamento. Quando você restringe o crédito, com
certeza a tendência é de redução do volume de vendas. Reduzindo o volume de
vendas, quem for fazer a tomada de decisão, quem conseguir ter crédito e puder
viabilizar a compra do imóvel vai ter um poder de barganha, um poder de
negociação, já que o mercado estará mais restrito.
Construção civil
Marco Aurélio Stumpf Gonzalez afirma que esse ambiente de
crédito embaraçado pelo juro
alto no país também afeta o ramo de construção e incorporação:
— Para construir, tu precisas ter dinheiro. E para ter
dinheiro tu precisas vender. Tem investidores, claro, mas precisa vender.
E nessa venda com taxa de juros mais alta sobra menos dinheiro pra
empresa.
O presidente da Abecip afirma que eventual mudança no ritmo
de demanda por crédito imobiliário também deve respingar no âmbito da
construção em razão de alterações na velocidade de vendas. No entanto, no
âmbito das unidades em fase de construção, esse impacto deve ocorrer em período
mais alongado:
— Com uma restrição, com custo de crédito imobiliário mais
alto, você vai diminuir o volume de transação. Com isso, você reduz a
velocidade de venda dos imóveis. Aí cabe ao incorporador, quem participa desse
mercado avaliar as condições. Evidentemente, o impacto maior é no mercado
secundário, que é o de imóveis prontos, e menor no de imóveis novos.
A mudança
Na nova regra da Caixa, quem financiar imóvel pelo sistema
de amortização constante (SAC), modelo no qual a prestação cai ao longo do
tempo, a entrada subiu de 20% para 30% do valor do imóvel. Já no sistema Price,
que conta com parcelas fixas, a quantia mudou de 30% para 50% (veja
detalhes abaixo).
As alterações
promovidas pela Caixa valem para financiamentos a partir da mudança na regra e
não afetarão as unidades habitacionais de empreendimentos financiados pelo
banco. Nessa situação, em que a Caixa financia diretamente a construção, as
condições atuais serão mantidas, segundo a instituição.
Novas regras valem para a concessão de crédito pelo Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), que usa recursos da caderneta de poupança